segunda-feira, 7 de maio de 2012

CONTO SEM PONTO.


                                   

          TABEFE NADA CATÓLICO

          Eu tinha ficado parado na estrada um pouco à frente da fila das pessoas que aguardavam no passeio que a procissão da festa da Senhora da Encarnação, tendo chegado ao Calvário cumprindo metade do percurso do costume, concluísse  as manobras  necessárias  para regressar ao ponto de partida pelo mesmo caminho.  Na minha curiosidade de criança em entender o que só os adultos fazem fiquei ali como que ausente, extasiado com o esforço dos homens que conduziam o pesado andor e o balanço do Senhor dos Paços de olhar contrito a ameaçar apear-se ali mesmo na calçada contra a vontade dos seus valentes transportadores.

          Quando reagi à dor provocada pelo impacto do tabefe que me atingiu a orelha e o rosto do lado esquerdo da cara acordando-me de supetão trazendo-me para a realidade do mundo, vi o indivíduo que me agarrava pelo braço esquerdo rudemente puxando-me para a berma. Não era muito alto, era redondo como uma abóbora velha, ralo no cabelo preto, vermelhusco de rosto com uma verruga de azeitona madura e uma vassourinha por baixo do nariz, com chispas medonhas a sair dos olhos escuros, muito juntos e pequeninos, sob duas espessas sobrancelhas unidas em forma de um triângulo com o vértice virado para o céu.

          Não consegui chorar porque o soluço que não pude conter ficou preso na garganta apertada, qual maçã-de-adão, saindo dali mergulhado numa confusão de sentimentos que me impediam de entender a razão de tão injusta como traiçoeira punição pois nada fizera, no meu entendimento ainda em construção, que a justificasse. Regressei para junto dos meus pais que tinham ficado no arraial da festa, mantendo-me calado mesmo quando a meio da tarde nos juntámos a outros familiares e amigos para comer o farnel à sombra das vinhas em redor, que era tradição, nesse tempo, levar para a festa grande em Vila Mou, e comer ao som das peças de música de afamadas Bandas postadas nos coretos perto da Igreja.

          A afronta não foi esquecida e sempre que avistava o castigador sem culpa julgada e sem direito a defesa, fosse entre amigos ou isoladamente e o local onde estivesse, a sede de desforra do sopapo desproporcionado e injusto aumentava na proporção dos anos que ia somando e do acrescento no tamanho já bem perto da estatura que havia de tornar-se a definitiva, suficientemente avantajada para lhe poder “comer as papas na cabeça”, expressão que no tempo da escola marcava a supremacia do mais forte nas rixas e brincadeiras do recreio. Sem que ele desse conta rondava por perto dissimulado e ia tirando as medidas para fazer o fato que precisa de lhe oferecer…

          A partir de certa altura notei na minha peça de caça uma alteração de comportamento porque sempre que eu andava por ali no meu jogo simulado à procura de puxar a corda do laço onde ele havia de se prender me olhava de soslaio, ao princípio com um ar confiante, ou mesmo esboçando um sorriso irónico, mas, com o passar do tempo pareceu-me ir perdendo a sobranceria de antes, notando-lhe uma certa inquietude e insegurança, refugiando-se sempre junto de amigos ou conterrâneos seus. Deve-lhe ter chegado aos ouvidos através das muitas pessoas que conheciam a história a minha intenção inabalável em desagravar, radical e pessoalmente, a ofensa sofrida.

        O homenzinho já andava de bengala e algo trôpego, ligeiramente curvado para a frente às voltas com problemas da saúde; tinha sido acometido de ataque cardíaco e sujeito a operação delicada de que acabou por recuperar e, o retrato odioso da primeira vez que o vira, e sentira (pudera!), tinha-se já diluído no acervo dos débitos incobráveis do meu foro privado de vinganças. Perante este quadro de fragilidade e decadência incontornável da vida humana, passada que era em mim também a fase da fogosidade própria da juventude e começava a entrar no estado da sabedoria empírica que só o passar dos anos confere, já não me restava na alma qualquer resquício de revindicta ou retaliação que saldasse o desagravo da ofensa antiga.

        O "F." (só lhe conheci a alcunha por que era tratado e de que mantenho sigilo) já está há muito na terra da verdade. Que tenha lá ao seu lado, reservado para mim um pequenino espaço onde possa vir a sentar-me e podermos conversar tranquilamente das coisas boas que vivemos aqui em baixo.

        Mas que não se apresse, teremos a eternidade para o fazer.

6 comentários:

  1. Bela história... que daria um excelente início para um romance. Por mim, continuava a leitura, sr. Remígio!

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  2. Já se esquecéu do trompudo que o Sr era e a pessoa rude e mal encarada o seu blog. é muito bom mas continua homen mal ecarado mas tem aprendido muito ser sosiavel e bom.

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  3. Meu caro anonimo 1.48. Nao o Remigio fui sempre um Homem educado, simples,culto e amigo do seu amigo. Um Homem da bola, da igreja bom pai de familia, afinal que e que o sr/sar que mais dos homens. Bom..e Lanheses e ha sempre uns a pedir a fome que os mate para descansar em paz! E mais.."quem nasceu para largaticha nunca chega a jacare..ha uns que querem selo...mas nao sabem como e..."

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  4. Porque sera entao, depois de apontar,todos esses falsos abtibutos ao Homem que, foi jogador de Lanheses, conviveu amalvemente com todo o grupo.foi depois jogador dos Lemianos sempre no convio de amizada que sempre o caraterizou. Fez parte da junta da freguesia, fez parte da direccao do extinto "Noticias de Lanheses, foi ensaiador e representou inumeras pecas de teatro e por fim e mordomo da cruz de Lanheses,e, para alem de tudo isto mantem o seu blog para dar a conhecer todas as noticias que vao surgindo umas boas outras tristes (como esta).Sera que o sr. nao tem que fazer ou estara no desemprego e nos a ter que o manter...Sera que o sr. nao sabe fazer justice a quem a merece?

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  5. após chegar a casa e abrir o dolethes, página que muito aprecio e todos deviam estimar. foi de boca aberta que eu li a mensagem do anónimo das 1h48m. é de alguém com muita maldade, não tem pingo de vergonha na cara e verdeiramente não conhece nem nunca se atreveu a conhecer. eu conheço-o, é um integro, respeitador, culto e educado. um homem de uma cultura geral acima da média, com prestigio dentro e fora de Lanheses.esta critica de bota a baixo conhecendo como conheço o sr. Remigio só lhe dá mais alento para fazer mais e melhor por Lanheses. tenho a certeza que aquilo que queriam é que ele não fosse tãp atento e não trouxess para o público as noticias que muito nos orgulham e maravilham.Jose Eduardo

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  6. de david pereira sr remigio venho de chegar a casa em frança e como sempre a primeira coisa è ver o que se passa de novo graças ao seu blogue e nao comprendo muito bem pourque hade haver sempre quintas culunas nao sei se me fasso comprender mas espero que o sr comtinue sempre como atè aqui david pereira

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