quinta-feira, 25 de julho de 2024

TER AMIGOS É PRIVILÉGIO

     


TER AMIGOS É PRIVILÉGIO

     Encontramo-nos  no início dos primeiros cinquenta do século passado, quando frequentávamos a Escola Industrial e Comercial de Viana do Castelo, ao tempo a funcionar no Jardim de D. Fernando, o Curso de Formação Geral do Comércio. O Tarcísio, de seu nome batismal, natural e residente na freguesia da Meadela, eu, Remígio, natural de Lanheses, à distância de dezena e meia de quilómetros da cidade vianense.

      A nossa relação foi espontânea e consolidada na harmonia da convivência nas aulas, e fora delas por causa de eventuais "feriados" de professores ou espaço em branco no horário, cujo tempo era por nós  preenchido com assiduidade na Biblioteca do Museu Municipal situado no Largo de S. Domingos, ali perto. Aí, escolhíamos e folheávamos as mais antigas publicações, preenchidas por caricaturas a representar figuras destacadas das letras e ações políticas da época, nas quais vinham inseridas expressões e críticas de fino humor para desfrute e gozo do público leitor. Frequentemente, quer a favor ou em modo de aliviar efeitos de má  digestão por parte do visado, a resposta constava da expressão "Talvez te escreva".

      Talvez te escreva! foi a primeira frase que atendi na chamada por telefone, cujo significado, inicialmente, não identifiquei no decurso de chamada ocorrida no ano passado. Parei uns segundos para ligar a expressão à identificação da voz que poderia ser de um amigo de que já não me recordava. Uma gargalhada em surdina confirmou a pessoa que o meu pensamento iluminou:

      O Tarcísio!

     Segui-se um longo diálogo onde predominou a evocação dos momentos que vivemos em comum há mais de setenta anos, desde aí sem contactos de qualquer natureza, o qual terminou com a marcação de um encontro por altura das férias que o Amigo viria gozar em Vila Nova de Cerveira. Tal não aconteceu, dado que o tempo ficou desfavorável, o que o obrigou a regressar a Lisboa onde tinha residência fixa.

    Na última semana do mês de junho, o Tarcísio voltou a ligar. E a marcar dia e hora para nos encontramos. Eram quatro da tarde do dia 22 do corrente mês de julho, e o Tarcísio, acompanhado pela esposa que eu não conhecia, demos o primeiro abraço na Rua dos Condes de Almada onde ele havia estacionado o Nissan, primo afastado do meu. 

    Durante cerca de duas horas falámos de nós e de ínfima parte das nossas vivências, ele, que enveredou no ramo da atividade bancária para terminar nas funções de inspeção, eu como funcionário público na administração escolar, agora aposentados, vivemos atualmente situação idêntica no que concerne à saúde das respetivas esposas. Mas o Tarcísio Machado Martins Cavalheiro, nome que ainda memorizo, enfrenta com determinação e coragem a sua situação de vida que mais nos aproxima e consolida a genuína nossa sentida amizade. 

    Como devo classificar a atitude de um Amigo, ausente silencioso da nossa vida comum há mais de sete décadas, com vida estabilizada e capacidade económica garantida, que não esquece e se preocupa em saber de um colega com quem conviveu num reduzido espaço de tempo, que não aguarda recompensa material de nenhuma ordem, mesmo da oferta que lhe fiz na cedência de apontamentos de inglês obtidos nas aulas do ilustre professor-doutor Joaquim Domingues dos Santos Costa, apenas e só porque quer relembrar momentos de convivência comum da vida passada, sete décadas depois de acontecerem? 

    Ser amigo é ato corrente; Amigo é privilégio para quem o tem .

    "Talvez te escreva", Amigo.

Remígio Costa

 

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