O REGATO DA SILVAREIRA
A fonte do Paraíso
A nascente: cenário fascinante.
Fui à fonte do
regato
Cujo nome é
Silvareira;
Vim de lá
estupefacto
Com tão bela
cachoeira.
É
verdade.
Era meu desejo antigo voltar à nascente do regato da Silvareira onde,
uma ou duas vezes, não sei bem, tinha estado era ainda rapaz em idade
escolar e do qual guardava uma vaga imagem de uma rusticidade em estado virgem, com um pequeno caudal de
água límpida e cristalina que brotava de uma cascata e a descer , depois,
sinuosa e cantante, a brincar às escondidas num leito de penedos lisos e
brancos onde se formaram pequenas poças naturais, entre margens de xisto e
vegetação luxuriante, numa harmonia de som e cor inebriantes.
Voltei lá há dois dia atrás. Estou maravilhado.
O
regato da Silvareira nasce a norte das fraldas da Serra d’Arga, no sítio com o
nome de “Penedo do Bufo”, no lugar da Silvareira, da freguesia de Arcos,
concelho de Ponte de Lima. É um curso de água de pequena relevância (está
mencionado na Wikipédia, mas sem discrição identitária) que vai desaguar ao rio
Lima na freguesia de Fontão, daquele concelho fazendo, em parte, a delimitação
natural do espaço territorial de Lanheses e S. Pedro de Arcos. Não seca na época
estival e deverá ter, da nascente à foz, uma extensão entre dez a doze
quilómetros. É, ou foi, rico em espécies aquícolas como trutas e enguias, que
muitas vezes tentei pescar com anzóis rudimentares feitos a partir da rede da
capoeira, lá de casa.
Tenho a
sorte, desde há muito tempo, de gozar da amizade de António Rocha, uma figura
de prestígio local vinculado à freguesia de São Pedro de Arcos que conhece, a
palmo, de ponta a ponta, e à porta de quem , de forma inesperada para ele, fui bater
e desafiei para me guiar até à Silvareira. Convite aceite, com ele ao volante de
um 4X4, logo depois tínhamos à vista as duas primeira casas do lugar, dois
antigos moinhos agora restaurados a preceito com pedra de xisto e coberto a telha de barro vermelho, num pormenor de modernidade
enquadrado num espaço verde cercado de um muro rústico em pedra miúda sobreposta.
Romântico e apetecível
Um
pouco à frente, escondido da vista de quem passe no troço pedregoso do caminho
rente ao muro feito a esmo em pedras de xistos, descobri os primeiros vestígios
do tesouro esquecido. Rompendo, a custo, por entre densa cortina de mato,
silvas e árvores de pequeno e médio porte, eucaliptos jovens e pinheiros
bravos, coberta de eras e silvado inóspito, estávamos junto à casa-moinho e à
corte dos animais de carga, em ruína avançada, da tia Leopoldina, moleira, alta e vestida de escuro pano,
de quem bem me recordo a tanger o burro ajoujado de sacos de milho ou de
farinha que devolvia aos fregueses, porta à porta, trabalho de que se
encarregava mais tarde a filha, nessa altura uma jovem que respondia com voz
solta aos piropos que ouvia.
Tão belo e cheio
de encanto
Melhor nome era
preciso
P’ra dar a este
recanto
A lembrar o
Paraíso.
Privado. Acesso condicionado.
Mais à frente, estávamos a franquear a porta do paraíso, em frente da
qual corre em cascata natural, um rego de água a descer para o regato que passa
um pouco abaixo. Aqui, viveu e cresceu a família de Manuel Silvareira, pai do
meu primo por afinidade , herdeiro do nome e a propriedade do progenitor,
estabelecido atualmente e residente nesta freguesia e, naturalmente, meu amigo
como fui do seu pai. Habitações e moinhos, uma parte requalificada e habitável
e, outras dependências a que restam as paredes e os indícios das estruturas dos
engenhos e das condutas da água trazidas por gravidade do regato, que fazia
mover as mós. Silêncio e memória, guardados por castanheiros, oliveiras,
pinheiros bravos, carvalhos e algumas árvores de fruto, num terreno em
socalcos, onde perpassa o ronronar persistente da corrente do regato da
Silvareira, ao fundo, a mostrar-se por entre o arvoredo, a reiterar a memória
imanente de um local com história de Vida, de Comunidade, de Paz e fruição da
Natureza, numa bela e sensível metáfora de paraíso terrestre.
Dali ao Penedo do Bufo há um percurso de
alguns metros marcado por passos humanos no declive em pedra de xisto onde
acontecem pinheiros bravos ao fundo do qual salta, de penedo em penedo,
irreverente, bravio, alegre, o regato da Silvareira. Mal contendo a avisada
prudência que a descida requeria, suporta-me uma corda como auxílio na descida
da pequena ladeira e…fico em êxtase a contemplar o Éden descrito no Velho
Testamento da Bíblia cristã! A poucos
metros da distância jorra do ventre da montanha a água pura que faz crescer em
mim uma sensação de volúpia e espanto, formando uma pequena bacia em forma de
espelho cristalino que é convite a um banho de Adão no Paraíso! Fico ali algum
tempo, esquecido das coisas do mundo, eu e a Natureza, bebendo da beleza e
fruindo da fonte que inspira e enche de Paz a alma e estimula os sentidos,
feliz pelo privilégio de viver este momento em harmoniosa identidade com os
princípios por que procuro guiar a minha conduta na vida.
Brinda-nos a
Natureza
Com tesouros preciosos
que o Homem, sem
sageza,
os considera
ociosos.
Habitação-moinho da família de Manuel Silvareira
2015.10.01
(Dia de S. Remígio)
Remígio Costa
Fotos: doLethes
Para breve: Santa Justa.
(Um comentário , por pequeno que seja, ajuda a melhor orientar futuros trabalhos)
EM BUSCA DO TESOURO ESCONDIDO
Na Silvareira:
o renovado;
o moinho da Tia Leopoldina;
espaço de habitações e moinhos, em parte requalificado, propriedade particular de herdeiros dos antigos moradores;
o regato ao fundo visto do local acima fotografado;
SUBINDO AO ENCONTRO DA FONTE DO REGATO
é aqui
DESCENDO COM A CORRENTE
F I M
Parabens oh "Eca"!
ResponderEliminarSr Remigio...
ResponderEliminarO paraíso não começa onde vc terminou sua jornada pela Silvareira... Siga o trilho até aceder ao que supõe (fizeram-no supor) ser o inicio do regato... Quando começa a descer para o local onde tem a corda... suba para um carreiro que se situa á sua direita. Siga o carreiro (ladeada pela levada) até encontrar o lugar onde dois caudais de água se juntam e formam um só... Daí suba o caudal da direita... até ao cimo... Se gostou do pouco que viu... ficará extasiado se fizer esse trilho. Para mais informações fale com o Sr Silvareira... Ele, melhor que ninguém, conhece o lugar e lhe explicará a "história" do outro caudal... (a sua descrição desse lindo lugar, apesar da eloquência e riqueza descritiva, contem algumas inverdades). Abraço
Sr Remigio quando falo em "inverdades", refiro-me por exemplo ao local que indica como a "nascente" do regato...
ResponderEliminarAnónimo das 10:47
ResponderEliminarSó tenho que agradecer. Entendeu o que pretendia no pedido que inseri no post Irei completar, então, o que iniciei, porque vale a pena..
Remígio
Ficará certamente maravilhado se completar o que começou... Nesse lugar que lhe falta conhecer... sentirá a ausência da civilização... Tudo é selvagem... A sua roupa e sua máquina de fotografar serão os únicos elementos de civilização e que contrastam com a sua envolvente... É bom chegar a esse lugar e imaginar que qualquer pessoa que ali estivesse há 2... 3... 4 mil anos atrás veria o mesmo que hoje vemos...
ResponderEliminarAbraço
Sr Remigio,
ResponderEliminarFiquei deslumbrado com o que li,sobre a ribeira da Silvareira e a sua area envolvente.De facto mesmo para quem conhece o local,ter lido o documentário que o senhor publicou fica ainda mais seduzido por aquele lugar,abençoado por Deus.Se me permite,apenas um senão.Mesmo com toda a sapiência que o senhor transmite do local,não deixou de adulterar a verdade,no que respeita à separação das freguesias de,Lanheses e São Pedro d'Arcos. Abraço
André
André:
EliminarAgradeço o seu comentário mas permita-me que diga que não compreendo o reparo de ter adulterado a verdade "no que respeita à separação das freguesias de Lanheses e São Pedro de Arcos", porque o que escrevi não visa recuperar qualquer diferendo que possa existir nessa
matéria, mas tão somente evocar uma convicção que no meu tempo de criança todos tínhamos sobre a "delimitação natural" duas freguesias. Nada mais.
Abraço de amizade.
Remígio
ResponderEliminarSr. Remigio
ResponderEliminarO documentário é extraordinário e vem provar que temos cá dentro coisas maravilhosas que nem uma grande parte dos locais conhece.
Aproveito para informar de que a Romaria de Santa Justa não se realiza em Junho, mas sim e sempre no terceiro Domingo ou fim de semana de Julho. Também o Cerquido não é freguesia mas sim um lugar da freguesia de Estorãos. A requalificação dos Quarteis não será de englobar no TH, mas o nome correto é CENTRO DE INTERPRETAÇÃO E VIVÊNCIA ATIVA DA NATUREZA-Quartéis de Santa Justa, composto por 2 quartos duplos e uma Camarata com capacidade para uma dezena de pessoas e a sua gestão está a carga do Município de Ponte de Lima, através da Área Protegida das Lagoas de Bertiandos e São Pedro Arcos e através de reserva.,
Espero ter acrescentado algo ao seu trabalho e continue a divulgar a beleza que nos rodeia.
Cumprimentos
Custódio Fernandes
Custódio Fernandes:
EliminarAs suas informações são preciosas. Dizer que o Cerquido é freguesia foi um lapso porque sei que é um lugar de Estorãos. Também não tinha a certeza se a festa de Santo Justa era em Junho. Arrisquei. Quanto aos dados referentes ao Centro de Interpretação de Vivência Ativa da Natureza é um acrescento de muita relevância ao texto que subscrevo. Por tudo isso, o meu agradecimento em nome pessoal e dos meus seguidores.
Abraço.
Remígio Costa