O trabalho que agora divulgo merece na minha opinião toda a credibilidade por se tratar de especialistas no assunto vinculados a uma universidade prestigiada como é a UTAD (Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro), e faz parte do trabalho assinado por dois jornalistas publicado na revista Magazine do Jornal Diário de Notícias, de Lisboa.
A peça não está transcrita na sua totalidade para não tornar excessivamente longa a sua leitura. Porém, o extracto agora divulgado contém o que a mim me pareceu bastante para ficar ciente da acuidade do problema deste animal invasor da nossa região, havendo sempre a possibilidade de o ler na íntegra procurando o sítio onde está na internet.
(Imagem internet)
Com a devida vénia aos seus autores e à publicação onde vem escrita transcrevo parte da reportagem a que acima me refiro.
(NOTÍCIAS MAGAZINE -DIÁRIO
DE NOTÍCIAS)
A morte
silenciosa das abelhas
por Ricardo J. Rodrigues Fotografia de Gerardo
Santos/Global Imagens
As abelhas estão cada vez mais ameaçadas de extinção.
A vespa velutina, uma espécie predadora que veio da Ásia, entrou em Portugal e
está a espalhar-se rapidamente pelo território, dizimando as colmeias. Sem
polinização, não há legumes nem frutos. O risco de uma crise alimentar é real.
As vespas estão em vigia, estacionadas sobre as
colmeias. São quatro ou cinco, às vezes dez. Permanecem horas a fio, no ar, à
espera. Revezam-se se estiverem cansadas. Assim que uma abelha arrisca a saída,
uma velutina ataca-a, perseguindo-a até a prender nas patas. Tem mandíbulas
fortes, com as quais não lhe custa muito decapitar a presa. Depois, suga a
massa interior do tórax da abelha e leva-a para o ninho, para alimentar a
criação. Umas horas depois, volta à vigia. As abelhas ficam com duas hipóteses
desgraçadas: ou largam da colónia para um voo suicida ou ficam lá dentro, até
morrerem todas .
O alarme tocou em setembro de 2011. Um apicultor
detetou um ninho de vespas perto de Viana do Castelo e chamou as autoridades.
Toda a gente fez figas para que aquele fosse um caso isolado, mas não era. «A
vespa autóctone em Portugal chama-se crabro e também se alimenta de abelhas,
mas apenas das que estão moribundas. Por isso até tem um papel útil: faz uma
limpeza seletiva da colmeia, conservando os exemplares mais fortes», diz Paulo
Russo, professor de zootecnia e investigador nos laboratórios apícolas da
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro (UTAD). «Esta espécie asiática não
só faz das abelhas a sua principal dieta como ainda inibe a saída dos insetos
da colmeia, matando milhares de abelhas em poucos dias. O impacte é
avassalador.»
A V espa velutina nigritorax chegou à Europa por via marítima, em 2004. As autoridades
francesas desconfiam que vieram num carregamento de bonsai , proveniente da China e descarregado em Bordéus. Nesse
ano, eliminaram três ninhos. Em 2005, cinco - e a coisa parecia controlada. Mas
em 2006 foram detetados 223 ninhos de vespa velutina em França e, um ano
depois, os animais tinham-se espalhado por metade do país: 1613 ninhos. Não
tardaram a chegar à Europa Central e ao Norte de Espanha. Há um ano e meio,
entraram em Portugal.
Em dezembro de 2012 estavam confirmados nove ninhos no
Alto Minho. No final de fevereiro, o número tinha subido para cinquenta. Do
distrito de Viana do Castelo espalharam-se para Braga e Vila Real. O Ministério
da Agricultura, a Direcção-Geral de Veterinária e a Proteção Civil decidiram
intervir, em parceria com os produtores. «Fizemos a localização de todos os
ninhos por GPS e destruímos os que estavam ativos, com maçaricos», conta
Alberto Dias, presidente da Associação de Apicultores do Minho e Lima (APIMIL).
«Como as vespas se dão em áreas urbanas, começámos a receber denúncias e o
número continua a aumentar. O problema são os ninhos que ninguém vê, na
floresta. É por aí que as velutinas vão continuar a progressão para sul. E vai
ser impossível travá-las.»
No final de janeiro, foi localizada uma colónia de
vespas num ilhéu do rio Minho e Alberto acompanhou os bombeiros para os
trabalhos de eliminação do ninho: um barco, carregado com o maçarico e as botijas
de gás, e uma escada para subir às árvores, que as vespas gostam da altitude.
«Quando lá chegámos, a colónia já tinha sido abandonada. Por isso, tirei-a da
árvore e trouxe-a comigo.» É um ninho impressionante, quatro ou cinco vezes
maior que os das vespas autóctones. Mede um bom meio metro e é feito das
substâncias orgânicas que as velutinas mascam para formar uma espécie de
argamassa. No centro são criadas as novas colonizadoras, que depois largam e
procuram um novo habitat . As velutinas avançam progressivamente, à procura de
abelhas. E, assim que escolhem uma nova geografia, umas constroem o ninho,
outras procuram os apiários. E esperam.
No Oriente, as abelhas asiáticas aprenderam a
defender-se das velutinas. Quando uma vespa prospetora entra na colmeia, a
colónia começa por fechar-lhe a saída. Depois as abelhas rodeiam o predador e
formam uma bolha ao seu redor, começando a bater as asas para criar calor. As
abelhas suportam temperaturas de 42 graus, as vespas apenas de 40. Então as
obreiras aquecem a temperatura da colmeia até aos 41 graus, quase se matando a
si próprias para eliminarem a vespa. Vão ser precisas décadas de evolução
genética para a abelha portuguesa conseguir fazer o mesmo.
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Sem abelhas, a cadeia alimentar teria obrigatoriamente
de mudar, já que setenta por cento dos produtos frutícolas e hortícolas que a
humanidade consome precisam das abelhas para o processo de polinização. «Nos
Estados Unidos, onde a praga se fez sentir, há apicultores que deixaram de
produzir mel e passaram a prestar serviços exclusivos de polinização dos
pomares», avisa Paulo Russo. Ou seja, as colmeias são levadas para as zonas de
onde estão naturalmente a desaparecer e operam uma polinização intensiva. «Os
serviços são pagos, encarecendo brutalmente o preço dos produtos alimentares.»
Em Portugal, há quem o faça a troco da cedência de terrenos para as abelhas. No
curto prazo, é possível que o cenário mude. E os preços, claro, aumentem.
As frutas seriam as primeiras a desaparecer. No caso
das amêndoas, elas desapareceriam quase por completo, enquanto as maçãs e os
pêssegos veriam um redução na casa dos oitenta por cento. Citrinos como a
laranja, o limão e a tangerina teriam uma redução de produção para menos de
metade. Os frutos exóticos desapareceriam, as peras passariam a ser um produto
de luxo. Depois, nas hortícolas, a extinção seria quase total. Sobreviveriam os
cereais, cuja maior parte da polinização é feita pelo vento. Os legumes, esses,
estavam condenados.
«Um cenário de extinção alteraria
toda a cadeia alimentar», vaticina o professor da UTAD. O desaparecimento das
frutas, dos legumes e das flores silvestres daria cabo de aves e herbívoros.
Consequentemente, os carnívoros não teriam o que caçar e o homem perderia a
maior parte dos seus recursos alimentares. O cenário traçado por Einstein pode
parecer catastrófico à primeira vista, mas tem a sua razão de ser. As abelhas
não estão só a lutar pela sua sobrevivência. Estão também a lutar pela nossa.
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Apicultores
precisam-se
Nos grandes
eucaliptais de Vila Nova de Cerveira, Gualdino Dias faz contas de cabeça. As
suas quatrocentas colmeias tornam-no num dos maiores produtores do Alto Minho,
região onde se produz 25 por cento do mel nacional. As vespas já andam de volta
das suas abelhas e o homem faz contas aos prejuízos. «Exporto noventa por cento
do que produzo, mas para isso preciso de ter grandes quantidades de mel. Se
reduzo, tenho de vender ao mercado português, que está dominado por grupos
económicos que compram a menos de um euro o quilo. Para fora, vendo o mesmo a
três euros.»
Existem
quase 18 mil apicultores em Portugal e o número está a crescer. O Algarve é a
zona de maior produção do país, seguida pelo Alto Minho, Trás-os-Montes e a
Beira Alta. Mais de noventa por cento dos produtores nacionais não são
profissionais, ou seja, têm menos de 150 colmeias. Gualdino Dias, que tem 74
anos, só depois da reforma decidiu dar atenção exclusiva às abelhas. Agora, num
ano bom, faz oito ou nove toneladas. «Isto é trabalhoso, porque a apicultura é
como a música, nunca tem fim.»
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Cada colmeia
tem entre dez e oitenta mil abelhas. Nos braços dos dois jovens apicultores
segue um ecossistema precioso. «É um animal fascinante, por toda a organização
e eficiência », e Frederico é todo sorrisos. Conta como as abelhas trabalham
ininterruptamente, até morrerem de exaustão. Tudo em prol da comunidade. «A
delas e, em última instância, a nossa.» Dinis tem outra visão: «É um animal
selvagem. Mesmo que te aproximes com fato de proteção, há sempre uma certa
ansiedade e nervosismo quando manipulas os favos e elas te atacam.»
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