domingo, 20 de dezembro de 2020

VIANA AMADA CONFINADA

  


      Nunca esperaria ver Viana assim: sábado, 19 de dezembro, pelas 15:00 horas, a cidade, o casco urbano, praças e ruas adjacentes, a ausência de ruído e de transeuntes conferia aos espaços vazios um ambiente de paz angustiante. As esplanadas com as cadeiras presas às mesas por correntes, portas das lojas de comércio encerradas, montras a aguardar o interesse de eventuais compradores, uma farmácia de serviço imposto sem serviço solicitado, a Sé vetusta e imponente inacessível, os gritos dum bando de gaivotas a sobrevoar os casario do casco urbano. Deixei a Praça antiga, centro cívico incomum, cheguei à Avenida, um cão atravessa a extensa via farejando o chão e logo desparece, apressado, sem incomodar um automóvel que, ao cimo, dobrou a esquina do Tribunal em direção à Praça da Liberdade. O Natário não vendia a torta de Viana nem as bolas de Berlim daí a inexistência da habitual fila em todo o corredor do passeio, numa mesa fora de porta alguém mais abaixo, mexia o açúcar na chávena no café da esquina, quiçá no uso do ritual de todos os dias. Na Picota reparo na deterioração de alguns prédios da ala esquerda antes de subir as escadas do Museu do Traje, (que foi sede do Banco de Portugal), hoje inacessível a visitas, e dou conta que, junto ao edifício da velha Câmara, um reduzido grupo de pessoas está envolvido na gravação de filmagens. Aproximei-me, era uma equipa de reportagem da RTP (deduzi pelas letras dos microfones que os promotores empunhavam) a gravar para futura divulgação na estação de televisão pública, tendo a colaboração de alguns elementos do Rancho Folclórico da Areosa, mas sem acompanhamento musical. Entretanto, surge, vindo do lado da Sé, um grupo de três pessoas denunciando a nacionalidade pelo sotaque espanhol. Na Praça da Erva, alguém falava alto dentro da pizzaria e, saindo para a rua, deu de frente com o grupo espanhol a passar na Rua do Poço. Desci até ao Lima, fotografei a pirâmide descolorida, o monumento da corrente quebrada (de novo), a Avenida dos Combatentes descaraterizada pelas arcadas feitas de lâmpadas, o Hotel (ainda) inacabado que foi o Aliança. As estruturas da iluminação festiva pareciam absurdas, inúteis, num cenário de deserto. Passei pela frente do Centro Cultural, fechado como os restaurantes da Praça, cheguei ao Gil Eannes, e, assombrado como o Fagundes a olhar para a foz do Lima, constatei que na doca comercial o ex-libris ficara sem espaço navegável pois toda ela estava preenchida com barcos de recreio turístico e de pesca. Um bando de gaivotas levantou, de repente, assustado com o som forte de um estouro.

          Fui até à nova Praia Norte, Caramuru e Catarina Ipaguaçú lá estavam recolhidos no centro da piscina, discretos, e afastados e escassos andavam por ali tão poucos usufrutuários para tanto espaço, estendendo-se ao longo da barra da praia a ameaçar ficar como deserto com o aproximar da penumbra da tarde. Um parque infantil, por estrear, continuava, ainda, envolvido no plástico do embrulho a desfazer-se.

          No regresso, o Campo d'Agonia parecia ainda maior do que na realidade é quando é dia de feira, percorri a estrada marginal contra a corrente do Lima até à ponte Eiffel, e, um pouco à frente, contornei uma rotunda e segui o percurso de casa. 

          Silêncio, por silêncio, fico bem no meu ninho.


































































Fotos: doLethes

Remígio Costa

2 comentários:

  1. Feliz Natal e Feliz Ano Novo, Sr. Remigio! Obrigado!

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  2. Fernando.

    Muito obrigado pelos votos formulados. Que o vosso Natal e o próximo Ano Novo tenha sido e venha a ser o melhor possível. Abraço.
    Remígio Costa

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